A rotina se repete a cada duas semanas. Por volta das 8 horas da manhã, Pércio de Souza, fundador da butique de investimentos Estáter — e principal assessor do empresário Abilio Diniz para fusões e aquisições , deixa seu escritório na avenida Juscelino Kubitschek, na zona sul de São Paulo, e embarca em seu helicóptero rumo a Sorocaba, no interior do estado, numa viagem de cerca de 20 minutos.
O destino do engenheiro curitibano de 48 anos é a brasileira Tecsis, maior fabricante de pás eólicas do país, com faturamento de 400 milhões de reais em 2010, e que exporta 99% de sua produção para clientes como Alstom e Siemens.
Lá, Pércio, como é conhecido, participa de reuniões com o presidente e fundador da Tecsis, o engenheiro aeronáutico Bento Koike, recebe fornecedores e clientes e visita as dez fábricas nas quais finas camadas de fibra de vidro, resina e espuma dão origem a enormes pás com peso de 9 toneladas e até 50 metros de comprimento.
Pergunta sobre cada etapa do processo, dos materiais empregados na produção ao transporte das pás. Esse acompanhamento minucioso começou em maio do ano passado, quando, junto com um grupo de bancos, do BNDES e da Unipar, Pércio comprou o controle da Tecsis por 150 milhões de dólares (mais uma conversão de dívidas no mesmo valor).
Apesar de ter desembolsado apenas 10% do total, ele assegurou para si a presidência do conselho de administração graças a um bem costurado acordo de acionistas. “A Tecsis era uma empresa inovadora, mas sem disciplina financeira. Aumentamos a cobrança por resultados e vamos triplicar de tamanho até 2012”, diz.
Segunda vida
As viagens a Sorocaba fazem parte de uma espécie de segunda vida de Pércio de Souza, agora encarnando o papel de investidor. Desde que fundou a Estáter, em 2003, ele fez fama e fortuna como articulador de grandes processos de fusão e aquisição, como a união entre a Casas Bahia e o Pão de Açúcar, em 2009, e a venda da Ipiranga para o grupo Ultra, em 2007.Agora, Pércio aproveita as comissões recebidas nesse tipo de negociação mais de 200 milhões de reais para fazer seus próprios investimentos em companhias consideradas promissoras.
A dedicação a essa nova atividade não foi alterada nem mesmo durante a malsucedida negociação para a compra da unidade brasileira do Carrefour pelo Pão de Açúcar, entre junho e julho deste ano, quando Pércio assessorou Abilio Diniz.
Para cuidar dos aportes, o agora banqueiro-empresário criou um novo braço de negócios, a Estáter GI, liderada por Eduardo Sancovsky, contratado em 2009 do Itaú BBA. (Os dois se conheceram no próprio BBA, onde Pércio trabalhou até fundar a Estáter.)
“Com os contatos que ele acumulou como assessor, fica fácil mapear boas oportunidades de investimento”, diz Marcelo Santos, sócio da consultoria de estratégia Doers. Além da Tecsis, a Estáter GI tem hoje duas outras empresas em seu portfólio. Uma é a construtora e incorporadora Dapo, com faturamento de 15 milhões de reais em 2010.
Com sede em Curitiba, a Dapo é uma criação de Pércio, que desejava voltar a atuar em sua área de formação, a engenharia civil. “Vou todos os meses a Curitiba para visitar as obras e avaliar os terrenos”, diz ele.
A outra é uma corretora de seguros, a TRR Securitas — formada após a compra de duas corretoras menores, a Securitas, em 2009, e a TRR, em 2010 —, cuja sede fica no mesmo edifício da Estáter, apenas cinco andares abaixo.
Apesar de atuarem em áreas distintas, as três companhias controladas pela Estáter são fruto da mesma estratégia de investimento. Pércio, por exemplo, não coloca dinheiro em empresas que possam trazer algum conflito de interesse com sua atividade de assessorar fusões e aquisições — hoje concentrada nos setores de varejo e óleo e gás.
A Estáter também só atua em empresas em que possa ter uma participação majoritária, ou pelo menos em que possa ditar os rumos — no caso da Tecsis, embora tenha participação menor que a de outros acionistas (12%, com opção de compra de mais 8% até 2015), Pércio tem o trunfo de presidir o conselho de administração.
Foi essa lógica que levou a Estáter a se desfazer, em maio de 2010, de uma fatia de 5,8% do grupo de restaurantes Úmbria, dono das marcas Spoleto e Koni e da franquia da rede de pizzarias Domino’s no Brasil. O último item de sua cartilha é buscar setores fragmentados e com grande potencial de crescimento — em que o capital possa permanecer por pelo menos uma década.
“No futuro queremos comprar mais duas empresas”, diz Sancovsky. Enquanto isso não acontece, a prioridade da Estáter continua sendo a assessoria de fusões e aquisições. De seus 30 funcionários, 23 trabalham exclusivamente com essas operações. Em agosto, foi aberto o primeiro escritório da Estáter fora do Brasil, em Londres, e outro deve ser inaugurado em Nova York.
“Hoje, só dedico 20% de meu tempo aos investimentos, mas daqui a alguns anos essa proporção vai se inverter”, diz Pércio de Souza. “Fazer fusões e aquisições é uma atividade muito estressante.”